Os chamados mecanismos defensivos do
Ego são recursos do psiquismo humano, cujo objetivo é proteger a pessoa de
sofrimentos identificados como insuportáveis para o consciente. Estes
mecanismos funcionam como uma barreira, filtrando o acesso das informações
armazenadas no inconsciente, até o consciente. Este processo pode ocorrer de
formas variadas, e cada pessoa pode utilizar mais um mecanismo do que outro, em
função de sua estrutura de personalidade.
Os mecanismos defensivos não são, em
si mesmos, um sintoma que deva ser combatido, mas um processo necessário de
equilibração entre a Individualidade e a Personalidade de cada indivíduo,
diante dos estímulos da vida diária, até que níveis mais elevados de
consciência de si mesmo possam ser alcançados por cada Ser em evolução. Cada
mecanismo defensivo pode ter também sua contrapartida positiva, auxiliando o
indivíduo a ultrapassar obstáculos internos ou externos. Ao falarmos de cada
mecanismo, citaremos também os contextos em que eles podem funcionar
positivamente, uma vez que toda situação tem dois lados e, para cada afirmação
o oposto também pode ser verdadeiro. Mais uma vez, o ponto de equilíbrio está
entre todos os extremos.
O primeiro teórico a identificar
estes mecanismos defensivos foi Sigmund Freud, o criador da Psicanálise. Ele
cita sete tipos de mecanismos de defesa:
11.1
– Repressão –
consiste num processo de censura que impede que desejos inconscientes
considerados inaceitáveis pelo sensor moral, sejam livremente expressos. Este é
um mecanismo muito utilizado em relação às questões de sexualidade e aspectos
éticos que envolvam a noção de certo e errado. É o principal instrumento
psíquico da educação rígida, tão comum na primeira metade do século XX,
fundamentada em severos conceitos de religião e disciplina. São tópicos comuns
da repressão: sexualidade, etiqueta social, tabus e preconceitos sociais, os
quais constituem o modelo de cada geração, em termos de certo e errado. Por
outro lado, a ausência total de limites, tornaria a vida social caótica,
impedindo que o indivíduo percebesse a necessidade de respeitar os direitos dos
seus semelhantes.
11.2
– Negação – É o
mecanismo presente nos estados psicóticos diante de uma realidade considerada
insuportável, do ponto de vista emocional, e com a qual a pessoa não sabe
lidar. A negação tem a finalidade de evitar a fragmentação emocional do Ser
(sentido figurado de coração partido). São tópicos comuns da negação:
falecimento de entes queridos, doenças graves e situações de perda em geral,
quando acima do limite emocional do indivíduo. Em alguns casos, entretanto, a
negação de uma doença, por exemplo, pode facilitar o processo de cura.
11.3
– Projeção – É o
mecanismo através do qual a pessoa projeta em outras, sentimentos e
características pessoais não aceitas, fazendo-lhes críticas exacerbadas. São
tópicos comuns da projeção: Todas as características de personalidade das
pessoas. No sentido positivo, a projeção pode ser utilizada em mentalizações de
ajuda a outras pessoas, projetando luz sobre elas.
11.4
– Sublimação – É o
mecanismo através do qual uma tendência é expressa de um modo socialmente mais
aceito. São tópicos comuns da sublimação: Tendências agressivas transformadas
em atividades esportivas em geral; sexualidade exacerbada, traduzida em
atividades criativas que, da mesma forma, expressam energia genésica.
11.5
– Introjeção –
Consiste na absorção para si, dos problemas e sentimentos identificados em
outros, gerando sobrecarga emocional, ocasionada por sentimentos de culpa ou
idéia de não ser suficientemente bom. São tópicos comuns da introjeção: todos
os comportamentos masoquistas, em que a pessoa se identifica com os problemas
alheios. No sentido positivo, é o mecanismo presente na captação psíquica, a
qual é realizada segundo critérios pré-estabelecidos de ajuda.
11.6
– Transferência – é o
mecanismo através do qual a pessoa transfere sentimentos positivos ou
negativos, originados numa relação anterior, para uma outra pessoa, a partir de
alguma semelhança entre ambas, em termos físicos ou psicológicos. São tópicos
comuns da transferência: Sentimentos negativos em relação a figuras de
autoridade ou sentimentos de perda de entes queridos. No sentido positivo, a
transferência permite que a motivação de vida se focalize em novos eixos, para
que a pessoa possa dar continuidade à sua vida.
11.7
– Deslocamento –
consiste na descarga de sentimentos gerados na relação com uma figura de poder,
sobre outra pessoa considerada menos ameaçadora. São tópicos comuns do
deslocamento: descarregar sentimentos de frustração e raiva, gerados no
trabalho, no contexto do ambiente doméstico, em especial sobre crianças e animais,
percebidos como mais fracos. Os deslocamentos podem ser positivos quando a
descarga de sentimentos e deslocada contextos adequados.
Frederic Perls, o criador da
Gestalt-Terapia, uma outra escola psicológica, também se refere aos mecanismos
defensivos do Ego. Além dos mecanismos já citados por Freud, Perls acrescenta
dois outros:
11.8
– Deflexão – o
mecanismo defensivo de deflexão leva o indivíduo a envolvimentos casuais com o
ambiente, onde ele obtém ganhos também casuais e, na maioria das vezes, perdas,
em virtude de seus investimentos sem focalização adequada. O indivíduo age como
se não estivesse interessado no mundo externo, mostrando-se alheio a tudo e a
todos. Tópico comum da deflexão: Fazer de conta que não se interessa por algo
que deseja e acredita que não poderá alcançar. No sentido positivo está a
própria tolerância à frustração.
11.9
– Confluência – Comum
em estruturas de personalidade masoquista, a confluência consiste na entrega às
influências do ambiente, deixando-se levar por elas, com o objetivo de reduzir as
diferenças e moderar a experiência perturbadora das divergências. Tópico comum
da deflexão: Todos os comportamentos diplomáticos e apaziguadores, em que a
pessoa não emite a própria opinião para não se comprometer. No sentido positivo
está a diplomacia, útil diante dos comportamentos mais exacerbados e
combativos.
Enquanto para Freud os mecanismos
defensivos do Ego precisam ser vencidos pelo cliente, constituindo uma
resistência ao seu crescimento interior, Perls os considera como partes
integrantes do próprio psiquismo do indivíduo, que atuam movidas por intenções
inconscientes positivas.
Este mesmo conceito está presente na
Psiconeurolingüística, teoria de Bandler e Grinder, quando eles se referem a
estes processos defensivos. Segundo esta moderna teoria da comunicação, são
três os mecanismos defensivos que aparecem na linguagem:
11.10
– Generalização –
consiste na expansão dos sentimentos de uma experiência única, para todo
contexto onde exista a sua possibilidade de ocorrência. Tópicos comuns da generalização:
Fobias em geral e experiências emocionalmente fortes, tais como traição e
acidentes. Ex.: Queimar-se num fogão e considerar todos os fogões perigosos;
ser traída e considerar todos os homens infiéis.
11.11
– Eliminação – como o
próprio nome diz, consiste na eliminação de parte da frase descritiva do
evento, a partir da supressão do objeto direto ou do objeto indireto que
necessariamente complementa o verbo, dando margem a mal-entendidos. Tópicos
comuns da eliminação: As próprias dificuldades de comunicação, ocasionadas por
baixa escolaridade, propiciam campo para inúmeras eliminações. Ex.: Ele me
feriu (quem fere, fere alguém com alguma coisa)
11.12
– Distorção – Consiste
em acreditar-se capaz de saber o que ocorre na mente do outro, pressupondo e
atribuindo-lhe intenções, com base na própria imaginação. Tópicos comuns da
distorção: Personalidades dominadores e donas da verdade, que acreditam saber o
que é melhor para os outros. Ex.: Ele agiu assim só para me ferir.
Conhecer como estes mecanismos
defensivos atuam em nosso psiquismo nos ajuda a compreender o comportamento de
nossos semelhantes e a identificá-los em nosso próprio comportamento, como
tendências que, quando tornadas conscientes, podem ser transformadas em
comportamentos mais positivos. Somente atravessando as barreiras estabelecidas
por estes mecanismos, chegaremos ao inconsciente mais profundo, onde estão
potenciais desconhecidos a serem resgatados e as tendências negativas a serem
polarizadas positivamente. Os mecanismos defensivos representam uma porta entre
o consciente e o inconsciente, que precisa ser atravessada, para chegarmos à
essência de nosso próprio ser e alcançarmos a condição de mestres de nós
mesmos, com uma ampla consciência de todos os erros e acertos ocorridos ao longo
de nossa trajetória evolutiva.
[1] Texto de
autoria de Sueli Meirelles, baseado em Psicanálise, Gestalt-Terapia e
Psiconeurolingüística..
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